"Eu caminhava muito, todos os dias. De repente, eu comecei a sentir um cansaço extremo. Não conseguia subir uma escada, sentia muita moleza", conta em entrevista à CNN. "Eu achei que fosse sedentarismo, ou que fosse consequência da obesidade ou de uma anemia", conta. No entanto, após consultar diferentes médicos e realizar diversos exames, o diagnóstico foi confirmado.
Essa é uma doença rara que atinge, em média, 40 a 55 pessoas a cada um milhão de adultos, de acordo com a Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT). O quadro é caracterizado pela pressão anormalmente alta nas artérias dos pulmões, podendo levar à falta de ar e à fadiga, até mesmo ao realizar movimentos leves.
"Nós temos um sistema circulatório que funciona em série. É como se fosse um grande circuito contínuo, com duas bombas localizadas no coração: uma que manda o sangue para todo o corpo, que fica no lado esquerdo, e outra que manda sangue para o pulmão, que fica no lado direito", explica Caio Fernandes, pneumologista do Instituto do Coração (Incor) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP), à CNN.
O especialista explica que a bomba do lado esquerdo é forte, com capacidade para mandar sangue sob alta pressão para todo o corpo. Já a bomba do lado direito é mais fraca, enviando o sangue para o pulmão em baixa pressão. "Por uma série de motivos, a pressão na área do pulmão pode aumentar, e a bomba do lado direito começa a falhar, sem conseguir lidar com essa pressão. Com isso, o paciente começa a ter sintomas de falência dessa bomba, como falta de ar e inchaço", afirma.
A hipertensão pulmonar é classificada em cinco tipos, de acordo com a causa da doença. São eles:
"Doenças que acometem a bomba do lado esquerdo podem causar doenças do lado direito; doenças do pulmão muito avançadas, como enfisema, fibrose pulmonar, apneia obstrutiva do sono, podem causar hipertensão pulmonar. Mas outras doenças bem diferentes, como doenças do tecido conectivo, esclerodermia e HIV, também podem causar hipertensão pulmonar. Então, é uma série de problemas que podem cursar com distúrbios nos vasos do pulmão", explica Fernandes.
A hipertensão pulmonar, inicialmente, é silenciosa, mas em casos avançados pode apresentar sintomas, principalmente falta de ar durante o esforço, tontura ou fadiga. Também pode ocorrer inchaço, especialmente nas pernas.
"Quando o quadro está bastante grave, eventualmente o paciente também tem desmaios", afirma Fernandes.
Os sintomas da hipertensão pulmonar, quando já bem estabelecida, podem ser incapacitantes. Ligia conta, por exemplo, que sua rotina foi extremamente impactada pelo diagnóstico da doença. Uma delas é a mudança de cidade. Por conta do tratamento, precisou voltar para Sorocaba, no estado de São Paulo, onde nasceu, e se afastar do Maranhão.
O segundo impacto aconteceu em sua rotina diária. Sem poder trabalhar e com muito cansaço para realizar tarefas comuns do dia a dia, Ligia preencheu seu tempo livre com cursos. "Fiz colégio técnico em alimentos e estou pensando em fazer, no próximo ano, um curso de segurança no trabalho. Eu não vou trabalhar com nenhuma dessas coisas, porque não consigo, mas pelo menos irei preencher meu tempo", conta.
O diagnóstico da hipertensão pulmonar pode ser feito com exames de imagem, como radiografias do tórax, ecocardiograma e eletrocardiograma. Eles costumam ser solicitados quando os médicos suspeitam da doença com base nos sintomas, principalmente em pessoas que tenham doenças pulmonares anteriores ou apresentam fatores de risco para desenvolver a hipertensão pulmonar.
Os testes de função pulmonar também podem auxiliar os médicos a avaliar a extensão da lesão pulmonar. O diagnóstico definitivo geralmente requer o cateterismo do lado direito do coração para medir a pressão sanguínea no ventrículo direito e na artéria pulmonar.
Tradicionalmente, o tratamento da hipertensão pulmonar inclui medicamentos para tratar a causa da doença e para aliviar os sintomas, como remédios que dilatam os vasos sanguíneos. Em alguns casos, é necessário o uso de cilindro de oxigênio para reduzir a pressão sanguínea nas artérias pulmonares e aliviar a falta de ar.
Por muitos anos, Ligia andou acompanhada do cilindro de oxigênio e fez uso de medicamentos vasodilatadores, como o Viagra, para tratar os sintomas, enquanto aguardava na fila do transplante de pulmão. Mas foi selecionada para participar de um ensaio clínico para um novo medicamento.
"O estudo era fechado, ou seja, não sabíamos quem ia tomar o medicamento e quem ia tomar placebo. Quando abriu, descobri que estava tomando uma dose de placebo e outra dose mínima do medicamento. E para mim já fez muita diferença. Eu saí da fila de transplante e parei de usar o oxigênio", conta.
O medicamento em questão é o Winrevair (sotatercepte), da farmacêutica MSD, que foi aprovado em dezembro de 2024 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e chegou às farmácias neste mês. O tratamento tem foco em aumentar a capacidade de exercícios e locomoção dos pacientes com hipertensão arterial pulmonar, além de reduzir os riscos de piora clínica.
Ele representa uma nova classe de terapia que melhora o equilíbrio entre a sinalização pró e antiproliferativa, regulando a proliferação de células vasculares associadas à HAP. A aprovação do tratamento foi baseada nos resultados do estudo clínico de Fase 3 "STELLAR", que comparou o Winrevair ao placebo, ambos em combinação com terapias de base em pacientes adultos com hipertensão arterial pulmonar.
De acordo com o estudo, adicionar o novo medicamento à terapia de base aumentou em 41 metros a distância percorrida pelos pacientes ao realizar o Teste de Caminhada de Seis Minutos, utilizado na avaliação de doenças pulmonares e cardiovasculares. Além disso, o tratamento reduziu o risco de morte e de piora clínica pela doença em 84%, quando comparado à terapia de base isolada.
"A minha qualidade de vida é outra agora. A medicação não cura, mas oferece mais dignidade", afirma Ligia.
O medicamento é istrado uma vez a cada três semanas por aplicação subcutânea, que pode ser realizada por pacientes e cuidadores, após treinamento e acompanhamento de um profissional de saúde.